Imagem ilustrativa do artigo sobre IA no Google Discover

Você já se sentiu sobrecarregado com a quantidade de notícias e desejou um resumo rápido e direto? O Google acredita que sim, e sua nova aposta pode ser o prego final no caixão do tráfego para muitos portais de notícia. Em um movimento que ecoa a controversa implementação dos "AI Overviews" na busca principal, o Google começou a testar resumos gerados por Inteligência Artificial diretamente no Discover, o feed de notícias personalizado em seu aplicativo móvel. O problema? Essa "conveniência" ameaça cortar o último fio de esperança que muitos publishers tinham para atrair leitores.

A Tempestade Perfeita: Google Discover e a Crise do Jornalismo Digital

A mudança, ainda em fase de testes, é sutil, mas seu impacto é potencialmente devastador. Em vez de uma manchete chamativa de um veículo de renome, o usuário pode ver um parágrafo gerado por IA que sintetiza a notícia, citando múltiplas fontes. Para o leitor, parece uma otimização. Para o produtor de conteúdo, que investiu tempo e recursos na apuração daquela matéria, é um desastre. A necessidade de clicar e visitar o site original diminui drasticamente, e com ela, a receita de publicidade e a chance de converter aquele leitor em um assinante fiel.

O Contexto da Queda: Mais um Golpe em um Setor Fragilizado

Este não é um evento isolado. É o mais recente capítulo na saga da tensa relação entre o Google e a indústria de notícias. Desde o lançamento dos AI Overviews, que fornecem respostas diretas na página de busca, os publishers vêm relatando quedas vertiginosas no tráfego orgânico. Dados da Similarweb, citados por veículos como a TechCrunch e The Economist, pintam um quadro sombrio: o tráfego de busca global caiu 15% em um ano, e o número de buscas por notícias que não resultam em nenhum clique saltou para quase 69% em maio de 2024. O Google Discover era visto como um dos últimos refúgios, uma fonte de tráfego significativa que ainda dependia do apelo das manchetes originais. Ao introduzir resumos de IA neste espaço, o Google efetivamente aplica a mesma lógica redutora de tráfego a um de seus produtos mais vitais para o ecossistema de notícias. A gigante da tecnologia se defende, afirmando que está apenas evoluindo a experiência do usuário e até lançou iniciativas como o "Offerwall" para ajudar publishers a encontrar novas formas de monetização, como micropagamentos ou pesquisas. No entanto, para muitos, essas soluções parecem um curativo pequeno para uma ferida arterial.

Análise: O Paradoxo da Inovação e a Luta pela Sobrevivência

O mais irônico nesta situação é que muitos dos próprios publishers, como The Wall Street Journal e Bloomberg, também estão experimentando com IA para sumarizar seus próprios conteúdos. É uma corrida armamentista digital: adota-se a IA para não ficar para trás, mesmo que a tecnologia, nas mãos de distribuidores como o Google, ameace sua principal fonte de sustento. A questão fundamental é sobre o valor da informação. A IA do Google não cria notícias; ela as processa. O trabalho de campo, a investigação, a checagem de fatos e a escrita cuidadosa ainda são feitos por jornalistas humanos em redações. Ao interceptar o usuário antes que ele chegue à fonte, o Google se beneficia desse trabalho sem oferecer a devida contrapartida, que no modelo atual, é o tráfego. O futuro parece incerto. Se essa funcionalidade for implementada em larga escala, poderemos ver uma aceleração na crise do jornalismo digital. Portais menores podem não sobreviver, e mesmo os grandes terão que repensar radicalmente seus modelos de negócio. A discussão se move para além do SEO e da otimização de cliques, entrando no território da sustentabilidade de um pilar democrático. A conveniência de um resumo de IA pode custar caro, e o preço pode ser a própria diversidade e profundidade da informação que essa mesma IA busca resumir.

(Fonte original: TechCrunch)